Escolhas

“Você é livre para fazer suas escolhas, mas é prisioneiro das consequências”. (Neruda)

Conselheiro e Diretor da Escola do TCE-PE – Valdecir Pascoal

 Vida é escolha. Na imprescindível “Ética a Nicômaco”, Aristóteles conta o drama vivido por uma tripulação que, em meio à tempestade, decide lançar parte da carga ao mar para equilibrar a embarcação e poder salvar as vidas. Escolha. No país de Alice, em certa encruzilhada do destino, ela pergunta ao sábio Gato Cheshire: – qual o melhor caminho? Ele responde: – depende para onde você deseja ir. Escolha. Lembrei dessas questões filosóficas a propósito dos dilemas vividos por gestores públicos, no atual contexto de pandemia.

No Direito Financeiro, quando se estuda o orçamento público, falamos de “escolhas trágicas”. Sendo as receitas limitadas, os responsáveis pelo orçamento precisam definir despesas realmente prioritárias. Amiúde, essas escolhas implicam sacrifícios de outras políticas públicas. Se esse desafio existe em condições normais, ele é tragicamente amplificado nas crises. Hoje, a saúde é prioridade absoluta, mas há serviços essenciais a merecer atenção: segurança, educação, ajuda aos vulneráveis. Para o adiável, olhos bem vendados e ouvidos de mercador. Escolhas.

A guiar os gestores nesta caminhadura, surge o farol que emana dos preceitos constitucionais relacionados aos direitos e objetivos fundamentais: vida, saúde, dignidade, redução das desigualdades, solidariedade e bem comum. À guisa de inspiração, descortina-se a luz republicana de Graciliano Ramos. Nos relatórios de prestação de contas de sua gestão, como Prefeito de Palmeira dos Índios (1928/29), ele nos brindou com eleição de prioridades, eficiência, transparência e ética.

Eis uma pequena amostra: “Consegui salvar em 70 dias 9:539$. É pouco. Entretanto, fiz esforço imenso para acumular soma tão magra, para impedir que ela escorregasse de cá, suprimi despesas e descontentei vários amigos e compadres que me fizeram pedidos. A Prefeitura foi intrujada quando, em 1920, aqui se firmou um contrato para fornecimento de luz. Apesar de ser um negócio referente à claridade, julgo que assinaram aquilo às escuras. É um bluff. Pagamos até a luz que a lua nos dá. Procurei sempre os caminhos mais curtos. Nas estradas que se abriram só há curvas onde as retas foram inteiramente impossíveis”. Escolhas.

PS1: Sobre coragem, escolhas e virtudes: “Ética a Nicômaco” (Aristóteles).

PS2: Coluna dedicada ao dileto Gilberto Marques Paulo, que me presenteou, em 2002, com essas relíquias: os relatórios do seu conterrâneo, o “Velho Graça”.

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