Minha vivência como auditor iniciou-se aos 19 anos de idade. Trabalhei em uma firma de auditoria independente. Aos 22, por concurso público, tornei-me auditor do Tribunal de Contas do Estado, com 25, professor universitário, e aos 28 ministrava aulas em cursos de pós-graduação. Fiz mestrado em contabilidade. Escrevi livros, artigos e ensaios.
Hoje estou com 56 anos de idade e cada vez com menos receio de dizer o que penso, expor o meu acreditar e pugnar pelos meus ideais. Fácil concluir, assim, que carrego nas costas 37 anos de exercício de controle. Isso posto, não preciso dizer que gosto dessa atividade, pois ninguém vive tanto tempo com alguém ou praticando alguma coisa sem paixão. Trago a paixão no nome. A sabedoria oriental nos ensina que “o homem comum fala, o sábio escuta, o tolo
discute”. Contudo, por ser humano, por vezes, deixo evidente, por vezes, os meus momentos de parvoíces e de porfias.
E por que inicio este breve relato dessa forma? Apresso-me a responder, para tentar evitar qualquer juízo de valor indevido, que aprendi com a escritora Lya Luft, que não devo agir para dar a público o meu currículo, mas tão somente para “dizer que não desconheço o assunto”. Posso afirmar que auditar faz parte da minha vida. Gosto da profissão que escolhi. Com ela uno o agradável ao agradável. Por ela, sou um apaixonado.
Todavia, por mais que eu pratique essa atividade, nunca saberei o suficiente. Quem será que sabe suficientemente sobre algo? Os tolos? Contudo, a cada nova experiência, aumenta a minha compreensão da importância de se definirem bem os critérios auditoriais para, assim, podermos reunir evidências adequadas. O critério auditorial é o parâmetro que vai permitir ao auditor definir qual a situação ideal, qual o procedimento correto, qual a prática esperada.
Já o termo evidência, que deixa transparecer um dispensável anglicismo, possui origem latina. Para o Dicionário Etimológico de Antônio da Cunha, ela deriva de evidentia, significando certeza manifesta. O Aurélio também admite a derivação do inglês evidence e que representa “aquilo que fornece ou contribui para fornecer prova da existência ou da ocorrência de algo”.
O termo evidência também pode designar o que é visível. Na Filosofia, é o “caráter de objeto de conhecimento que não comporta nenhuma dúvida quanto à sua verdade ou falsidade”. Se no mundo jurídico o substantivo “evidência” é “elemento forte ou consistente de um fato, sem prova objetiva”, o adjetivo de dois gêneros “evidente” é o fato que “por si só determina ou comprova”, como ensina o Grande Dicionário Sacconi.
Nada obstante, no âmbito da técnica auditorial, evidência ganha conotação própria, específica, e corresponde à prova da ocorrência de um achado ou constatação de auditoria, obtida com base em critério adequado. No universo auditorial, que abarca vários ramos do conhecimento, esse termo compreende o que comprova ou refuta algum achado. Ou seja, no ramo da auditoria, é a constatação exuberantemente provada. Em resumo, é a prova. Isso só.
Para melhor esclarecer, registro que o XII Congresso da Organização Internacional de Entidades Fiscalizadoras Superiores (INTOSAI), realizado em abril de 1986, em Sidney, Austrália, solicitou que o Tribunal de Contas das
Comunidades Europeias elaborasse um “projeto de glossário dos principais termos e expressões utilizados na auditoria externa da administração pública”.
A Corte de Contas europeia delegou a realização dessa missão aos colaboradores P. Everard e D. Wolter, que apresentaram o “Glossário de Termos de Auditoria” com o objetivo fundamental de criar um primeiro nexo de união
entre os idiomas francês, inglês, alemão, espanhol, italiano, holandês, dinamarquês, português e grego.
Para o termo evidence, o Glossário apresenta a seguinte definição: “Provas documentais e outras informações relevantes nas quais o auditor se baseia para formular uma constatação ou uma conclusão e para elaborar o seu relatório”. Como é sabido, um auditor somente pode expressar uma opinião ou comentário sobre o tema objeto de estudo após obter evidências suficientes (quantidade) e adequadas (qualidade) sobre a conformidade ou não em relação ao critério estabelecido.
Resta claro que, ao planejar seus exames, o auditor não pode se esquecer de definir precisamente os critérios que serão utilizados e discutir as suas aplicabilidades com a administração do ente auditado, de modo a obter as
adequadas evidências, e para poder emitir relatórios objetivos e imparciais. Ao finalizar estas reflexões auditoriais, peço perdão pelo excesso de tecnicismo, bem como se o azo desses comentários não se tornou evidente. As minhas
limitações como auditor e, mais ainda, como ser humano não me permitiram fazer diferente. Todavia, como disse o saudoso cientista Carl Sagan, “a ausência da evidência não significa evidência da ausência”.
*Inaldo da Paixão Santos Araújo é Mestre em Contabilidade. Conselheiro corregedor do Tribunal de Contas do Estado da Bahia, professor da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), escritor