Enjoy the moment
Antes que os puristas da língua pátria condenem o título deste meu escrito, apresso-me em explicar que vi essa frase estampada na camiseta de um velho e sorridente senhor que me acompanhava, tempos idos, em uma agradável caminhada matinal pela ainda triste e abandonada orla de Patamares, em Salvador. Em tradução livre, a oração quer dizer. “Aproveite o momento”.
Como sou contador por formação e auditor por paixão, sempre sou instado a me preocupar como que passou, para tentar, prudentemente, enfrentar o futuro. E nesse excesso de conservadorismo, muitas vezes por falta de competência, deixo de desfrutar as oportunidades e os prazeres momentâneos com que a vida nos brinda. Eis um bom motivo para que eu desnude minha entidade, esboce – agora – estas linhas que continuadamente estão avidas por leitores e encontre o meu verdadeiro valor original.
Apesar de em Salvador existirem apenas duas estações – ou chove ou faz sol, era um lindo dia. Sim, era uma bela manhã de primavera, com brilhante céu azul e um divino balé de borboletas sobre o infinito do sem-fim. Lembrei-me de um instigante poema de Cecilia Meireles e sorri.
Ao continuar meu caminhar, do nada, recordei-me também de que, certa feita, ouvi um grande professor de filosofia afirmar que era preciso assistir mais à Sessão da Tarde. Confesso que, e como já revelei naqueles tempos antanhos, considerei a recomendação um tanto quanto descabida e estranha para alunos de um curso de pós-graduação, quase todos profissionais e pais de família, quase todos cheios de afazeres e compromissos que a vida nos impõe.
Contudo, partindo de onde partiu a sugestão, também julguei que talvez fosse prudente refletir sobre ela. A palavra de um mestre, sempre, não nos deve fazer pensar?
O tempo passou e, como tantas outras coisas, acabei esquecendo aquele conselho provocativo. Hoje, talvez, instigado pela frase estampada na camiseta do risonho senhor, e um pouco mais amadurecido relembro os bons ensinamentos e concluo que ele – o filósofo Saja – tinha e tem razão.
Com isso não quero dizer que esperei uma década para defender a audiência de qualquer tipo de programa televisivo, meu caro e apressado leitor (sorrio novamente), mas, sim, que cada vez mais quero acreditar que se faz necessário e imperioso despir-me das molduras que deixo a vida me retratar, romper com determinados dogmas e, simplesmente, fazer coisas inusitadas. Afinal, o que realmente nos dá prazer enquanto ser pessoa?
Mas, por mais que deseje essa mutação imediata, sempre fico preocupado como amanhã (olha o carma contábil querendo aflorar novamente). É natural que seja assim, porém não posso também esquecer que, por sermos humanos, o amanhã pode até mesmo não acontecer. Sendo assim, nada mais importante do que aproveitar o momento.
Termino meus 60 minutos prazerosos de caminhada e entro no carro para iniciar a minha labuta. Ligo o rádio e ouço, encantado, a canção Beautiful Day da banda de rock irlandesa formada no ano de 1976, U2 “It’s a beautiful day. Don’t let * get away/It’s a beautiful day (É um lindo dia/Não deixe ele escapar. É um lindo dia)
Há muito não a ouvia. Ao degustá-la, como aprendi com Rubem Alves, encanto me com mais uma mensagem divina e digo para mim mesmo hoje é meu aniversário (mesmo não sendo, obviamente, 10 de dezembro). Não vou trabalhar tampouco vou ficar em casa assistindo à televisão à tarde. Simplesmente vou viver e aproveitar o meu momento. Enfim, hoje é um magnifico beautiful day e não vou, e não posso deixá-lo escapar. O que faço sorrindo […]
Mestre em Contabilidade. Conselheiro corregedor do Tribunal de Contas do Estado. Professor. Escritor. Inaldo_paixao@hotmail.com