Desigualdade
Inaldo da Paixão Santos Araújo
Mestre em contabilidade, conselheiro-corregedor do Tribunal de Contas do Estado da Bahia, professor, escritor inaldo_paixao@hotmail.com
No artigo “Necessidade moral”, publicado no jornal Folha de S.Paulo, em 1º/4/2020, o ex-ministro da fazenda Delfim Netto, ao concluir que o Brasil nunca mais será o mesmo depois da pandemia da Covid-19, afirmou que o país precisa “repensar a volta do seu crescimento com maior aumento da igualdade de oportunidades e ênfase total na perspectiva de aumento do acesso geracional de seus cidadãos. A crise talvez seja uma oportunidade civilizatória”. Delfim Netto, entre inúmeros cargos públicos que ocupou, foi ministro da Fazenda, de 1967 a 1974 durante o regime militar. Ao defender, em primeiro plano, os investimentos em infraestrutura e a industrialização e, em segundo
momento, a distribuição de renda, cunhou frase emblemática: “Primeiro temos de fazer o bolo crescer para depois distribuí-lo”.
A Constituição Cidadã de 1988, em seu art. 3°, apresenta, como um dos objetivos fundamentais da República, o erradicar da pobreza e da marginalização e o reduzir das desigualdades sociais e regionais.
Nada obstante esse preceito constitucional, que deve ser verdadeiro farol para todo gestor público, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua Rendimento de Todas as Fontes 2019, elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aponta que o Indice Gini, principal termômetro da de desigualdade social, no país, alcançou 0,509, em uma escala de o a 1.
Segundo o estudo, os 10% mais pobres detinham o 8% do rendimento, enquanto os 10% mais ricos concentram 42,9%. A pesquisa também aponta que a renda média mensal de 1% dos mais ricos corresponde a 33.7 vezes a remuneração dos 50% dos mais paupérrimos.
O Especial do jornal A TARDE de
31/3/2020, “Superlotação de casas desafia o isolamento social na Bahia”, demonstra, com a costumeira precisão jornalística, como seria dificil realizar o imperioso afastamento para o combate à Covid-19, pois “mais de 630 mil baianos dividem quartos com quatro ou mais pessoas”.
Ao confirmar o resultado da pesquisa do IBGE, a matéria traz a lume a comovente história da catadora de material reciclável Telma Batista. Essa cidadā de um país desigual divide sua casa com um irmão e sete crianças. Ao afirmar que não tem medo do coronavirus, ela conclui: “O medo atrai coisa ruim. No entanto, se alguém pegar a doença, é cada um por si. Se for para adoecer, vamos adoecer. Se for para morrer, assim será. Sempre morre mais gente do lado de cá, do lado da pobreza”
Resta provado que o bolo, se cresceu, foi e está sendo mal dividido.
Ao concluir este artigo, espero que razão assista à catadora e ao ex-ministro. Ou seja, que o resignado povo brasileiro não tenha medo do que está por vir e que, após a passagem da peste, sejamos mais humanos e menos desiguais.
Artigo publicado no Jornal A Tarde, de Salvador.