“Tenho coragem de mamar em onça”

Presidente do TCE-AM, Mário de Mello, promete divulgar lista de gestores que tiveram contas reprovadas: “Quem fez o mal, que pague”

Respeitado internacionalmente pelas ações de controle e preservação ao meio ambiente, o Tribunal de Contas do Amazonas (TCE-AM), também tem se destacado pelas ações de combate à pandemia do novo coronavírus, pela otimização de seus programas e serviços virtuais, bem como porque será a primeira corte de contas a regulamentar o decreto de indisponibilidade de bens de gestores e ex-gestores públicos. Além de passar a certificar, com um selo de qualidade, aqueles outros que tiverem suas contas aprovadas, em notável ação pedagógica.

Quem fala sobre esses avanços é o Presidente do Tribunal, o Conselheiro Mário Manoel Coelho de Mello, alagoano de nascimento, porém cidadão amazonense em reconhecimento aos 30 anos de relevantes serviços prestados ao estado onde fixou morada. Com mais de 42 anos de vida pública, já foi vereador em Maceió (AL) e secretário estadual de Ação Social em Roraima. Em sua trajetória no TCE-AM, já foi  Ouvidor-Geral, Presidente da 2ª Câmara e Vice-Presidente do Tribunal.

Revista Justiça & Cidadania – O senhor assumiu a Presidência em janeiro, em plena pandemia. Como foi a adaptação do TCE-AM ao novo contexto?

Mário de Mello – A pandemia tem sido um momento de muita instabilidade na sociedade e exigiu de todos uma readaptação. Com o Tribunal de Contas não foi diferente, tivemos que nos adaptar ao trabalho remoto que, por sua vez, já estava em fase de estudos para ser definitivamente implantado. Readaptarmos nosso sistema eletrônico de processos (SPEDE) de modo a garantir o acesso remoto, em horário estendido, das 7h às 22h, de segunda a sexta-feira. Além disso, adotamos providências para manter o atendimento ao público externo e aos jurisdicionados, por meio dos canais de comunicação do Tribunal e da criação do robô JARVIS, que funciona por meio do Whatsapp, de modo a orientar e auxiliar os servidores deste Tribunal e o público externo acerca das atividades da Corte no período de isolamento social. Já foram realizados, com êxito, mais de seis mil atendimentos remotos, facilitando a comunicação e inserindo o órgão de controle na era digital.

RJC – O TCE-AM foi uma das primeiras cortes de contas a adotar sessões virtuais no julgamento de processos. A virtualização das relações institucionais vai continuar quando os trabalhos voltarem a ser presenciais?

MM – Todas as medidas adotadas durante o período da pandemia e que trouxeram melhorias às nossas atividades serão mantidas e melhor desenvolvidas quando do retorno às atividades regulares. Uma das atividades precípuas do Tribunal de Contas é o julgamento dos processos de controle externo. Justamente com o escopo de mantermos a Corte em pleno funcionamento e exercício de suas atividades constitucionais é que estabelecemos as sessões virtuais para julgamento dos processos eletrônicos, que podem ser acompanhadas em tempo real por todos que acessarem nosso site (www.tce.am.gov.br) no horário previsto. A sessão virtual permite a maior participação da sociedade no momento de deliberação, via Youtube, Instagram e Facebook, sendo o TCE-AM um dos primeiros a utilizar essas ferramentas em conjunto. Já tramita em nossa Corte o Processo SEI n° 4000/2020,  que tem como objetivo instituir a Sessão Virtual como modalidade de sessão do Tribunal de Contas. Outro mecanismo é a implantação do peticionamento eletrônico, que facilitará o acesso das partes e advogados aos autos, bem como trará mais rapidez e segurança no protocolo das demandas.

RJC – Além das sessões virtuais, o TCE-AM foi o primeiro a ter os processos 100% digitais. Quais são os benefícios para a sociedade?

MM – Toda tramitação processual das cautelares, assim como dos demais processos na Corte podem ser acompanhada virtualmente. Significa dizer que todos os novos processos no TCE-AM são 100% virtuais. Estamos em um esforço contínuo de reduzir ao máximo o uso de papel, para preservar o meio ambiente, economizar recursos, desburocratizar os procedimentos e processos, agilizar nossos atendimentos e julgamentos. Atualmente, contamos com 14 mil processos em tramitação, dos quais 11 mil são digitais e cerca de três mil ainda são físicos.

RJC – Falando em pandemia, como o TCE-AM vem fiscalizando os atos administrativos praticados para o enfrentamento da crise sanitária na capital e interior do estado? Como o Tribunal procede e como o cidadão pode exercer o controle social desses gastos?

MM – Quanto à fiscalização concomitante, foi criado o Comitê de Monitoramento dos recursos públicos durante o período de emergência da covid-19 para fazer o acompanhamento das despesas destinadas ao enfrentamento da pandemia. Porém, somente as despesas com valores exorbitantes ou suposto preço fora da realidade de mercado (superfaturamento), são remetidos à Presidência e em seguida enviadas aos Relatores das Contas de cada órgão do estado, da capital e do interior. Quanto ao levantamento do volume de gastos apurados no Governo do Estado, na Prefeitura de Manaus e no interior do Amazonas, no Estado do Amazonas está havendo acompanhamento no sistema AFI, no qual foi constatado até o presente momento a contratação em torno de R$ 190 milhões, para o enfrentamento à pandemia. Já no Município de Manaus está sendo realizado um acompanhamento no sistema AFIM da Prefeitura, que até o presente momento registrou a aplicação de recursos em torno de R$ 20 milhões. Em relação aos municípios do interior, o TCE-AM constatou que o Fundo Estadual de Saúde repassou cerca de R$ 70 milhões até o presente momento.

Quanto à apuração de possíveis irregularidades via controle social, o cidadão pode exercer seu controle por meio da ouvidoria, que é o canal direto do TCM-AM para apresentação de denúncias, reclamações, elogios e sugestões. Apesar da suspensão do atendimento presencial nesse período de isolamento social, estamos analisando e respondendo, no prazo legal, todas as manifestações recebidas através do site (ouvidoria.tce.am.gov.br), WhatsApp (92-8815-1000) e e-mail (ouvidoria@tce.am.gov.br).

RJC – A Constituição diz que o controle externo da Administração Pública cabe ao Poder Legislativo, com auxílio dos Tribunais de Contas. Existe algum tipo de ação coordenada entre o TCE-AM, a Assembleia Legislativa do Amazonas e outros órgãos de controle?

MM – Não há, até o momento, uma programação formal de ações coordenadas. Contudo, o Tribunal tem como política institucionalizada atender de pronto as solicitações oriundas da Assembleia Legislativa, no que tange ao exercício do controle externo. Cita-se, por exemplo, a disponibilidade de dois servidores do TCE-AM para compor a Comissão Parlamentar de Inquérito da Saúde, os quais foram requisitados pela própria CPI. Contudo, entre o TCE-AM e outros Órgãos de controle, há acordos de cooperação técnica firmados com a Controladoria Geral da União, com a Controladoria Geral do Estado do Amazonas, com os tribunais de contas de Minas Gerais e do Distrito Federal, com o Ministério Público Federal e com a Receita Federal.

RJC – Em ano de eleições, em respeito à Lei da Ficha Limpa (LC nº 135/2010), uma das missões do TCE é encaminhar à Justiça Eleitoral e ao Ministério Público Federal e Estadual a lista com o nome dos gestores e ex-gestores que tiveram as contas reprovadas. A lista será amplamente divulgada?

MM – Faço questão de divulgar a lista, quem fez o mal, que pague. O TCE fará uma coletiva de imprensa, inicialmente em agosto, e irei entregar às mãos da sociedade os nomes dos maus gestores. Não terei papas nas línguas. Sou uma pessoa que procura ser cortês, educada e gentil, mas por outro lado, tenho coragem de mamar em onça, por isso não tenho receio nenhum. Tenham certeza que vou convocar a imprensa, quem for mal gestor, nós vamos informar. O cidadão brasileiro tem que saber quem é mau gestor, tem que saber a figura que ele vai votar e reconduzir.

RJC – Por outro lado, o TCE-AM também informará quem são os bons gestores públicos. Como isso será feito?

MM – Trata-se do Selo de Qualidade que, a partir deste ano, passará a ser entregue pelo Tribunal para certificar os gestores públicos que prestarem contas corretamente dos recursos aplicados durante o exercício financeiro. É uma obrigação constitucional do Tribunal fiscalizar as contas públicas. Assim como mostramos à sociedade os gestores que tiveram as contas julgadas irregulares por nosso Tribunal Pleno, iremos passar a certificar os bons gestores. O selo será baseado em iniciativa similar da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) e será dividido em três categorias: ouro, bronze e prata. O selo ouro será destinado ao gestor público que cumprir todas as normas e a legislação, que prestar contas dentro do prazo estabelecido em lei e que cumprir todas as recomendações emitidas por órgãos de controle. O selo prata será emitido aos gestores que cumprirem todas as determinações, mas que, por ventura, tenham incorrido em algum equívoco. Já o selo bronze será destinado aos gestores públicos com maior número de equívocos ou impropriedades. As normas e o regulamento que estabelecerão as regras para concessão do selo de qualidade já foram discutidos pelo corpo técnico do TCE-AM e serão encaminhados para discussão pelo Tribunal Pleno e posterior publicação no Diário Oficial Eletrônico (DOE) do Tribunal.

 

Leia entrevista no site Justiça e Cidadania

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